19.10.11

Sobre arte digital e Speed Painting

Speed Painting nada mais é do que o processo de pintura filmado e depois acelerado. Geralmente se faz direto no computador. Digo geralmente porque ficou popular na internet este tipo de "show" com pinturas feitas digitalmente por meio de tablets, no Photoshop ou softwares similares. Não, não são tablets como o Ipad. Na verdade, esse termo (tablet) é bem antigo pra ilustração e quer dizer "mesa digitalizadora". É uma espécie de mouse pad eletrônico onde se usa uma espécie de "caneta-mouse" com a qual se pode simular quase que perfeitamente as técnicas de desenho e pintura do lápis, caneta, pincel, papel, tela, etc.

O principal responsável pela popularização deste gênero, acredito que seja o Nico di Mattia. Um argentino que, se não foi o primeiro a fazer isso, foi o primeiro a ganhar tamanha visibilidade no mundo ao fazer isso. Talvez porque o cara seja um MONSTRO! A técnica dele é simplesmente impressionante.

Por algum tempo eu relutei em entrar nesse mundo de pintura digital. Não sei, mas quem faz arte tradicional geralmente tem esse receio. O que me deixou mais inclinado a comprar meu tablet foram os vídeos do Nico di Mattia. Tive vontade de pintar daquele jeito também. Além do mais, é sempre bom a gente desenvolver novas técnicas de pintura e desenho.

São muitas as vantagens de se trabalhar com tablets, mas eu diria que são principalmente dois grandes saltos que se pode dar ao passar pra arte digital: Primeiro, uma ilustração que eu antes demoraria 3 ou 4 dias com aquarela ou guache, eu faço em aproximadamente 5 a 6 horas no tablet. Segundo, tem a possibilidade de ctrl + z. Entre muitas outras vantagens eu diria que tem uma única desvantagem, que é a de a gente não ficar com o trabalho "original" que antes se tinha com ilustrações tradicionais. O "original" neste caso é o arquivo PSD em alta resolução, que, se não tomarmos cuidado, um dia pode ser perdido devido a um vírus, pane, etc.

Se alguém for comprar um tablet, eu recomendo a Wacom Bamboo CTH 460, que é de longe o melhor custo/benefício do mercado. Tem outros modelos como a Cintiq, que só é aconselhável pra quem tem um estúdio profissional e muito dinheiro.

Abaixo, dois vídeos de Speed Painting. Enjoy!

O vídeo do aprendiz (eu): Penny, de The Big Bang Theory.


O vídeo do mestre (Nico di Mattia): Iron Man.


6.10.11

Tributo a Steve Jobs


Este é o discurso de Jobs na universidade de Stanford. Abaixo, a transcrição completa:



Estou honrado de estar aqui, na formatura de uma das melhores universidades do mundo. Eu nunca me formei na universidade. Que a verdade seja dita, isso é o mais perto que eu já cheguei de uma cerimônia de formatura. Hoje, eu gostaria de contar a vocês três histórias da minha vida. E é isso. Nada demais. Apenas três histórias.

A primeira história é sobre ligar os pontos.

Eu abandonei o Reed College depois de seis meses, mas fiquei enrolando por mais 18 meses antes de realmente abandonar a escola. E por que eu a abandonei? Tudo começou antes de eu nascer. Minha mãe biológica era uma jovem universitária solteira que decidiu me dar para a adoção. Ela queria muito que eu fosse adotado por pessoas com curso superior. Tudo estava armado para que eu fosse adotado no nascimento por um advogado e sua esposa. Mas, quando eu apareci, eles decidiram que queriam mesmo uma menina.

Então meus pais, que estavam em uma lista de espera, receberam uma ligação no meio da noite com uma pergunta: “Apareceu um garoto. Vocês o querem?” Eles disseram: “É claro.”

Minha mãe biológica descobriu mais tarde que a minha mãe nunca tinha se formado na faculdade e que o meu pai nunca tinha completado o ensino médio. Ela se recusou a assinar os papéis da adoção. Ela só aceitou meses mais tarde quando os meus pais prometeram que algum dia eu iria para a faculdade. E, 17 anos mais tarde, eu fui para a faculdade. Mas, inocentemente escolhi uma faculdade que era quase tão cara quanto Stanford. E todas as economias dos meus pais, que eram da classe trabalhadora, estavam sendo usados para pagar as mensalidades. Depois de seis meses, eu não podia ver valor naquilo.

Eu não tinha idéia do que queria fazer na minha vida e menos idéia ainda de como a universidade poderia me ajudar naquela escolha. E lá estava eu, gastando todo o dinheiro que meus pais tinham juntado durante toda a vida. E então decidi largar e acreditar que tudo ficaria ok.

Foi muito assustador naquela época, mas olhando para trás foi uma das melhores decisões que já fiz. No minuto em que larguei, eu pude parar de assistir às matérias obrigatórias que não me interessavam e comecei a frequentar aquelas que pareciam interessantes. Não foi tudo assim romântico. Eu não tinha um quarto no dormitório e por isso eu dormia no chão do quarto de amigos. Eu recolhia garrafas de Coca-Cola para ganhar 5 centavos, com os quais eu comprava comida. Eu andava 11 quilômetros pela cidade todo domingo à noite para ter uma boa refeição no templo hare-krishna. Eu amava aquilo.

Muito do que descobri naquela época, guiado pela minha curiosidade e intuição, mostrou-se mais tarde ser de uma importância sem preço. Vou dar um exemplo: o Reed College oferecia naquela época a melhor formação de caligrafia do país. Em todo o campus, cada poster e cada etiqueta de gaveta eram escritas com uma bela letra de mão. Como eu tinha largado o curso e não precisava frequentar as aulas normais, decidi assistir as aulas de caligrafia. Aprendi sobre fontes com serifa e sem serifa, sobre variar a quantidade de espaço entre diferentes combinações de letras, sobre o que torna uma tipografia boa. Aquilo era bonito, histórico e artisticamente sutil de uma maneira que a ciência não pode entender. E eu achei aquilo tudo fascinante.

Nada daquilo tinha qualquer aplicação prática para a minha vida. Mas 10 anos mais tarde, quando estávamos criando o primeiro computador Macintosh, tudo voltou. E nós colocamos tudo aquilo no Mac. Foi o primeiro computador com tipografia bonita. Se eu nunca tivesse deixado aquele curso na faculdade, o Mac nunca teria tido as fontes múltiplas ou proporcionalmente espaçadas. E considerando que o Windows simplesmente copiou o Mac, é bem provável que nenhum computador as tivesse.

Se eu nunca tivesse largado o curso, nunca teria frequentado essas aulas de caligrafia e os computadores poderiam não ter a maravilhosa caligrafia que eles têm. É claro que era impossível conectar esses fatos olhando para frente quando eu estava na faculdade. Mas aquilo ficou muito, muito claro olhando para trás 10 anos depois.
De novo, você não consegue conectar os fatos olhando para frente. Você só os conecta quando olha para trás. Então tem que acreditar que, de alguma forma, eles vão se conectar no futuro. Você tem que acreditar em alguma coisa – sua garra, destino, vida, karma ou o que quer que seja. Essa maneira de encarar a vida nunca me decepcionou e tem feito toda a diferença para mim.

Minha segunda história é sobre amor e perda.

Eu tive sorte porque descobri bem cedo o que queria fazer na minha vida. Woz e eu começamos a Apple na garagem dos meus pais quando eu tinha 20 anos. Trabalhamos duro e, em 10 anos, a Apple se transformou em uma empresa de 2 bilhões de dólares e mais de 4 mil empregados. Um ano antes, tínhamos acabado de lançar nossa maior criação — o Macintosh — e eu tinha 30 anos.

E aí fui demitido. Como é possível ser demitido da empresa que você criou? Bem, quando a Apple cresceu, contratamos alguém para dirigir a companhia. No primeiro ano, tudo deu certo, mas com o tempo nossas visões de futuro começaram a divergir. Quando isso aconteceu, o conselho de diretores ficou do lado dele. O que tinha sido o foco de toda a minha vida adulta tinha ido embora e isso foi devastador. Fiquei sem saber o que fazer por alguns meses.

Senti que tinha decepcionado a geração anterior de empreendedores. Que tinha deixado cair o bastão no momento em que ele estava sendo passado para mim. Eu encontrei David Peckard e Bob Noyce e tentei me desculpar por ter estragado tudo daquela maneira. Foi um fracasso público e eu até mesmo pensei em deixar o Vale (do Silício).

Mas, lentamente, eu comecei a me dar conta de que eu ainda amava o que fazia. Foi quando decidi começar de novo. Não enxerguei isso na época, mas ser demitido da Apple foi a melhor coisa que podia ter acontecido para mim. O peso de ser bem sucedido foi substituído pela leveza de ser de novo um iniciante, com menos certezas sobre tudo. Isso me deu liberdade para começar um dos períodos mais criativos da minha vida. Durante os cinco anos seguintes, criei uma companhia chamada NeXT, outra companhia chamada Pixar e me apaixonei por uma mulher maravilhosa que se tornou minha esposa.

A Pixar fez o primeiro filme animado por computador, Toy Story, e é o estúdio de animação mais bem sucedido do mundo. Em uma inacreditável guinada de eventos, a Apple comprou a NeXT, eu voltei para a empresa e a tecnologia que desenvolvemos nela está no coração do atual renascimento da Apple.
E Lorene e eu temos uma família maravilhosa. Tenho certeza de que nada disso teria acontecido se eu não tivesse sido demitido da Apple.

Foi um remédio horrível, mas eu entendo que o paciente precisava. Às vezes, a vida bate com um tijolo na sua cabeça. Não perca a fé. Estou convencido de que a única coisa que me permitiu seguir adiante foi o meu amor pelo que fazia. Você tem que descobrir o que você ama. Isso é verdadeiro tanto para o seu trabalho quanto para com as pessoas que você ama.

Seu trabalho vai preencher uma parte grande da sua vida, e a única maneira de ficar realmente satisfeito é fazer o que você acredita ser um ótimo trabalho. E a única maneira de fazer um excelente trabalho é amar o que você faz.
Se você ainda não encontrou o que é, continue procurando. Não sossegue. Assim como todos os assuntos do coração, você saberá quando encontrar. E, como em qualquer grande relacionamento, só fica melhor e melhor à medida que os anos passam. Então continue procurando até você achar. Não sossegue.

Minha terceira história é sobre morte.

Quando eu tinha 17 anos, li uma frase que era algo assim: “Se você viver cada dia como se fosse o último, um dia ele realmente será o último.” Aquilo me impressionou, e desde então, nos últimos 33 anos, eu olho para mim mesmo no espelho toda manhã e pergunto: “Se hoje fosse o meu último dia, eu gostaria de fazer o que farei hoje?” E se a resposta é “não” por muitos dias seguidos, sei que preciso mudar alguma coisa.

Lembrar que estarei morto em breve é a ferramenta mais importante que já encontrei para me ajudar a tomar grandes decisões. Porque quase tudo — expectativas externas, orgulho, medo de passar vergonha ou falhar — caem diante da morte, deixando apenas o que é apenas importante. Não há razão para não seguir o seu coração.

Lembrar que você vai morrer é a melhor maneira que eu conheço para evitar a armadilha de pensar que você tem algo a perder. Você já está nu. Não há razão para não seguir seu coração.

Há um ano, eu fui diagnosticado com câncer. Era 7h30 da manhã e eu tinha uma imagem que mostrava claramente um tumor no pâncreas. Eu nem sabia o que era um pâncreas.

Os médicos me disseram que aquilo era certamente um tipo de câncer incurável, e que eu não deveria esperar viver mais de três a seis semanas. Meu médico me aconselhou a ir para casa e arrumar minhas coisas — que é o código dos médicos para “preparar para morrer”. Significa tentar dizer às suas crianças em alguns meses tudo aquilo que você pensou ter os próximos 10 anos para dizer. Significa dizer seu adeus.

Eu vivi com aquele diagnóstico o dia inteiro. Depois, à tarde, eu fiz uma biópsia, em que eles enfiaram um endoscópio pela minha garganta abaixo, através do meu estômago e pelos intestinos. Colocaram uma agulha no meu pâncreas e tiraram algumas células do tumor. Eu estava sedado, mas minha mulher, que estava lá, contou que quando os médicos viram as células em um microscópio, começaram a chorar. Era uma forma muito rara de câncer pancreático que podia ser curada com cirurgia. Eu operei e estou bem.

Isso foi o mais perto que eu estive de encarar a morte e eu espero que seja o mais perto que vou ficar pelas próximas décadas. Tendo passado por isso, posso agora dizer a vocês, com um pouco mais de certeza do que quando a morte era um conceito apenas abstrato: ninguém quer morrer. Até mesmo as pessoas que querem ir para o céu não querem morrer para chegar lá.

Ainda assim, a morte é o destino que todos nós compartilhamos. Ninguém nunca conseguiu escapar. E assim é como deve ser, porque a morte é muito provavelmente a principal invenção da vida. É o agente de mudança da vida. Ela limpa o velho para abrir caminho para o novo. Nesse momento, o novo é você. Mas algum dia, não muito distante, você gradualmente se tornará um velho e será varrido. Desculpa ser tão dramático, mas isso é a verdade.

O seu tempo é limitado, então não o gaste vivendo a vida de um outro alguém.

Não fique preso pelos dogmas, que é viver com os resultados da vida de outras pessoas.

Não deixe que o barulho da opinião dos outros cale a sua própria voz interior.

E o mais importante: tenha coragem de seguir o seu próprio coração e a sua intuição. Eles de alguma maneira já sabem o que você realmente quer se tornar. Todo o resto é secundário.
 
Quando eu era pequeno, uma das bíblias da minha geração era o Whole Earth Catalog. Foi criado por um sujeito chamado Stewart Brand em Menlo Park, não muito longe daqui. Ele o trouxe à vida com seu toque poético. Isso foi no final dos anos 60, antes dos computadores e dos programas de paginação. Então tudo era feito com máquinas de escrever, tesouras e câmeras Polaroid.

Era como o Google em forma de livro, 35 anos antes de o Google aparecer. Era idealista e cheio de boas ferramentas e noções. Stewart e sua equipe publicaram várias edições de Whole Earth Catalog e, quando ele já tinha cumprido sua missão, eles lançaram uma edição final. Isso foi em meados de 70 e eu tinha a idade de vocês.

Na contracapa havia uma fotografia de uma estrada de interior ensolarada, daquele tipo onde você poderia se achar pedindo carona se fosse aventureiro. Abaixo, estavam as palavras:

“Continue com fome, continue bobo.”

Foi a mensagem de despedida deles. Continue com fome. Continue bobo. E eu sempre desejei isso para mim mesmo. E agora, quando vocês se formam e começam de novo, eu desejo isso para vocês. Continuem com fome. Continuem bobos.

Obrigado.


4.10.11

Sobre gostos e preferências musicais (ou não)


Recentemente tem rodado o Facebook uma carta aberta à Cláudia Leitte, em resposta aos comentários infelizes que ela fez sobre o Rock in Rio. Isso tem gerado insatisfação por parte de algumas pessoas que gostam do estilo "musical", o qual ela canta e defende. A principal alegação das pessoas indignadas (hã?) é de que cada um tem o seu gosto e que isso deve ser respeitado.

De fato, cada um tem o seu gosto. De fato, isso tem que ser respeitado. Mas é importante lembrar que o gosto de cada um varia de acordo com o nível intelectual de cada um. É um grande erro colocar o axé no mesmo patamar do rock, como se fosse apenas questão de gosto. Não, não é só questão de gosto, mas fundamentalmente de conhecimento. Antes de entrar mais profundamente no tema, gostaria de ressaltar que eu estou generalizando sim. Não ignoro que pode existir lá no meio do nada um cara supostamente "ignorante" que por si só acabou gostando de Mozart. Também não ignoro que possa existir um ou outro professor universitário, doutor, que, eventualmente, seja fã de pagode. Sempre, inevitavelmente, vão existir essas situações que fazem a gente repensar as nossas convicções. Legal, bacana! Mas não é o caso aqui. Aqui eu vou ignorar essas exceções pra deixar a linha de raciocínio mais clara.

Música, para quem não sabe, é composta de três elementos fundamentais: Harmonia, melodia e ritmo. Isso é a primeira coisa que se aprende, ao estudar teoria musical. Também aprendemos as diferenças entre um compasso simples e um compasso composto, aprendemos sobre intervalos, técnica, etc. Alguns são capazes de reconhecer uma boa música naturalmente, e outros não. Eu me encaixava no segundo grupo até que eu aprendi essas coisas. Aprendi a tocar violão, fiz aula de guitarra. Enfim, aprendi um pouco. Aprendi o bastante pra saber diferenciar uma carne de quinta de um filé. Felizmente, todos são livres pra estudar e aprender que existe sim música boa e música ruim. E isso sem basear o "bom" e "ruim" em gostos pessoais, mas em fatos.

É bem simples, não? Existe o bom e o ruim, mas não é tão simples (para a maioria) diferenciar os dois. Vamos simplificar as coisas. Imagine a música como qualquer outra área do conhecimento humano. Vamos tomar como exemplo arbitrário a arquitetura.

É notório que existe a boa e a má arquitetura. É também notório que isso é notório pra muita gente. Acontece que, convenhamos, ao avaliar uma boa obra, um arquiteto é mais qualificado pra identificar o que é melhor e o que é pior dentro da sua área do que um leigo, certo? O mesmo acontece pra psicologia. Eu posso considerar este ou aquele psicólogo bom. Mas eu não entendo de psicologia, eu não estudei isso. Minha opinião é baseada no achismo, é baseada no "gosto". Eu sou leigo! Se um psicólogo me indica outro melhor, é óbvio que a visão dele sobre o assunto é mais clara que a minha e, portanto, é mais fácil que ele me dê uma melhor possibilidade! Não porque ele prefere este ou aquele, mas porque ele sabe o que é melhor.

Se me pedirem pra identificar o melhor entre dez jogadores de críquete, eu não saberei identificar. Pois não entendo nada de críquete. Mas de futebol eu entendo, e é claro tanto pra mim quanto pra qualquer um que saiba um pouquinho de futebol que não é questão de "gosto" dizer que o Kaká é melhor jogador que o Richarlysson. Eles não são "diferentes" apenas, mas sim: um é melhor que o outro. É claro que nada te impede de gostar do Richarlysson (sick!), todos são livres pra isso. Mas certamente é um erro grotesco dizer que, por exemplo, sob determinado ponto de vista o Richarlysson pode ser considerado melhor, ou que "pra você" ele é melhor. Não, não é. Este é o ponto central: independente do que você acha e do que eu acho, o Kaká é melhor, e a nossa opinião e gosto pessoais nada têm a ver com isso. Com um detalhe muito interessante: ambos são jogadores de futebol, mas de posições diferentes.

Com tudo isso, eu quero dizer o seguinte: não afirmo que pagode, axé, funk, etc são ruins simplesmente porque não gosto. Eu afirmo isso - categoricamente - porque entendo um pouquinho de música. Entendo o bastante pra dizer que o Radiohead é infinitamente superior ao Exaltassamba pelo mesmo motivo que o Messi é infinitamente superior ao Landu. Pelo mesmo motivo que o Frank Gehry é um arquiteto infinitamente superior a mim, e por aí vai. Não é "gosto" é "conhecimento".

Não estou dizendo que é necessariamente obrigatório gostar do que é melhor. A partir do momento que você tem a capacidade de diferenciar o que é bom do que é ruim, aí sim passa a ser questão de gosto estritamente pessoal. Pois quando você sabe, você é capaz de reconhecer o "bom" naquilo que é mais simples. Aliás, frequentemente músicas mais simples têm mostrado mais "feeling" que músicas muito complexas.

Eu mesmo não tenho o melhor dos gostos. Não estou falando aqui como quem está "acima" de tudo isso, mas como quem reconhece as coisas como elas são e sabe muito bem onde está. Eu sei que tem músicos melhores do que os meus preferidos, e nem por isso gosto deles. Entende como vira uma coisa muito pessoal a partir de um determinado ponto, e não na coisa toda? Pois é, a parte subjetiva da coisa é muito relevante sim, mas NÃO é ela que vai determinar o que é tecnicamente melhor. A subjetividade não é "mensurável", enquanto que a capacidade técnica do músico é. Uma vez que nem todos vão passar a gostar das coisas boas só de conhecê-las, é importante reconhecer aquilo que está para além da subjetividade, além dos gostos e opiniões pessoais. Ou melhor, aquilo que está acima dos nossos gostos e opiniões pessoais.

E se você não entende de música, eu lamento, mas a sua opinião com certeza vale menos que a daquele que entende, assim como a minha opinião vale menos que a de um médico na hora de falar de medicina, assim como a minha opinião vale menos que a de um mecânico pra falar sobre motores, e por aí vai.

Esse texto pode parecer ofensivo pra alguns. É normal. Ninguém quer parecer "menos inteligente" devido ao seu gosto musical. Mas na verdade ninguém é "menos inteligente" por isso, acontece que muitas pessoas levam a coisa pro lado pessoal, sentindo-se pessoalmente ofendidas quando se deparam com algo que é diferente do que elas pensam. E como eu estou frequentemente tentando deixar as coisas claras de uma forma impessoal, é inevitável que surjam visões críticas ao extremo.

De qualquer forma, é mais fácil colocar tudo no mesmo nível e dizer que é apenas questão de "gosto" do que procurar entender de música - ou de qualquer outra coisa - um pouco mais profundamente, pra enxergar a realidade. Em outras palavras: é mais fácil rebaixar o que está acima do que tentar elevar os seus padrões, pois isso exige esforço. E se você se sente incomodado(a) com tudo o que eu escrevi até agora, tenho uma péssima notícia pra você: o mesmo que eu falei pra música serve pra qualquer tipo de arte, serve pro tipo de filme que você gosta, pro tipo de livro que você lê e pro tipo de vida que você leva.

1.10.11

Parábola Zen - O Velho Templo

NOTA: Não sei se é esse o título da parábola. Ouvi essa história há alguns anos e, como está entre as minhas preferidas, resolvi reproduzir aqui do meu jeito, devido à falta de uma versão melhor aqui pela rede.

Certa vez, um templo passava por sérias dificuldades materiais. Tudo estava muito velho, caindo aos pedaços. Faltava comida, faltava tudo.
Os monges, já sem aguentar ver o templo naquela situação, foram ao mestre para pedir orientações. O mestre,  reconhecendo a situação precária em que se encontravam, passou uma missão a seus discípulos:
-É preciso que vocês todos vão até a cidade mais próxima e roubem tudo o que puderem. Só tem uma condição: Ninguém pode vê-los, absolutamente ninguém, entenderam?
Os monges acharam estranho que o mestre tenha dado uma ordem como esta, porém ele era o mestre e eles tinham que cumprir a missão. Assim sendo, todos os discípulos partiram até a cidade mais próxima, com o objetivo de saquearem tudo o que pudessem. Exceto um, que ficou a meditar.
O mestre, então, indagou o discípulo que ficara no templo:
-O que você faz aqui? Não ouviu o que eu disse?
-Sim, mestre. Eu ouvi. E estou fazendo exatamente o que o senhor mandou. O senhor disse que absolutamente ninguém poderia me ver. Acontece, mestre, que EU estou me vendo. Como posso roubar assim?